カポエイラとは？
O que é capoeira?

Inicialmente, apresento uma breve explicação sobre as características, a semântica e a etimologia da capoeira, seguida de uma introdução sobre a sua origem enigmática. Depois, tento fazer um resumo da história da capoeira, desde sua criminalização, seu processo de sistematização, popularização e globalização, até ser registrada como patrimônio cultural imaterial do Brasil e da humanidade. 

A capoeira é uma manifestação cultural popular brasileira que mistura artes marciais/esportes de combate, música, dança, tradição, filosofia e outros elementos culturais de várias etnias principalmente originários da África. A bateria regida pelo berimbau, instrumento que simboliza a capoeira, os participantes e os espectadores formam uma roda, onde duas pessoas gingam livremente ao ritmo da música e desenvolvem um jogo de ataque e defesa.

Os movimentos acrobáticos chamam a atenção, porém, a mandinga, um elemento essencial da capoeira, não apenas confunde e engana o/a oponente no jogo, mas também surpreende e encanta quem está assistindo. Além disso, a atuação da bateria e o canto respondido pelo coro criam a união de toda a roda, libertando todas as pessoas presentes das amarras da vida cotidiana.

A palavra portuguesa "capoeira" é geralmente grafada em japonês como "カポエイラ" (ka-po-e-i-ra) ou "カポエラ" (ka-po-e-ra), mas a grafia mais próxima da pronúncia popular "capuêra" seria "カプエーラ". Aqui será adotada a grafia "カポエイラ" que é a mais comum. Em relação ao significado da palavra capoeira, nos dicionários japoneses encontramos a definição: "arte marcial, jogo, luta, dança ou, ainda, luta dissimulada sob a forma de dança".

Originalmente, antes de ser associado à arte marcial ou à dança, etc., o termo capoeira já era usado com o significado de "gaiola de aves" ou "mata secundária". Ainda, em antigos documentos oficiais brasileiros, era utilizada a nomenclatura "capoeiragem" associada a expressões com conotação socialmente negativa, como "vadiagem" ou "vagabundagem", enquanto "capoeira" indicava quem a praticava, ou seja, o/a "capoeirista".

Existem várias hipóteses sobre a origem do termo capoeira, sendo que a mais difundida é a que sugere ser uma derivação da expressão tupi "kaá-pûera" (mata que foi), que indica "mato ralo", o local para onde os escravos fugidos se escondiam. No entanto, a expressão correta em tupi é "kó-pûera" (roça que foi), não sendo a etimologia para capoeira no sentido de "cultura popular", pois trata-se apenas de um empréstimo da origem da acepção "mata secundária".

Embora também existam hipóteses que sugerem a origem sendo de línguas bantu, o termo português usado no sentido de "cesto (para aves)" é considerado um forte candidato para a etimologia que batizou a cultura popular brasileira de "capoeira". Além de ser utilizado para colocar aves de capoeira (de criação), o cesto era um utensílio indispensável para transportar mercadorias por escravos de ganho em áreas urbanas, tais como vendedores de aves, ambulantes e estivadores, etc., que praticavam a capoeira (cultura popular) em seu tempo livre e, assim, acredita-se que o nome teria derivado do cesto usado por essas pessoas.

Entre o século XVI e o início do século XIX, o comércio transatlântico de escravos levou aproximadamente 5 milhões de africanos ao Brasil. Devido a muitos pertencerem a grupos étnicos Bantu da região de Angola, a "dança da zebra" (engolo) do Sudoeste de Angola era considerada a origem da capoeira. No entanto, uma pesquisa nos últimos anos concluiu que, apesar das similaridades, o engolo difícilmente teria ligação direta com a capoeira, sugerindo que é muito provável a capoeira ter se originado no Brasil como resultado da fusão de várias culturas nativas do continente africano.

A obra "Jogar Capoëra ou danse de la guerre" em que a capoeira foi retratada pela primeira vez, datada por volta de 1835, mostra uma atmosfera alegre com música e dança ao som de um tambor, executadas abertamente num local urbano, onde podemos observar, ao mesmo tempo, um confronto entre dois oponentes com punhos cerrados trocando olhares severos. A teoria mais aceita sobre a origem da capoeira diz que ela foi disfarçada como "dança" para ocultar que era uma "arte marcial/luta". No entanto, é possível que a música tenha sido usada desde o início como uma forma dos negros preservarem sua cultura e identidade.

No início do século XIX, ocorreram frequentes rebeliões de escravos no Brasil, como a Revolta dos Malês (1835) liderada por negros muçulmanos na cidade de Salvador, Bahia, o que resultou em restrições mais severas aos negros. Apesar da mistura de diferentes grupos étnicos tenha sido vista por alguns como uma forma de aumentar seu desentendimento e evitar, assim, a formação de forças rebeldes, os "batuques", encontros de música e dança, incluindo a capoeira, que eram realizados na rua também foram sujeitos a regulamentação.

Na segunda metade do século XIX, várias gangues da cidade do Rio de Janeiro, conhecidas como "maltas de capoeira", foram respaldadas por políticos, ocasionando inúmeros tumultos, assassinatos e outros incidentes que se tornaram um grave problema social. Com o objetivo de conter essa ameaça, a capoeira (capoeiragem) foi considerada um "crime" na reforma do código penal de 1890 e permaneceu proibida por meio século, até a disposição ser removida em 1940.

Originalmente, na capoeira não existia um sistema de graduação como a atual. A capoeira era praticada em ruas e praças públicas, onde acredita-se que aqueles que se destacavam nas rodas eram naturalmente chamados de bamba ou mestre. O curta-metragem "Vadiação" (Alexandre Robatto Filho, 1954) é um valioso registro audiovisual, que conta com a participação de renomados mestres da velha guarda da Bahia e nos permite vislumbrar uma capoeira clássica, ultrapassando as barreiras dos estilos modernos recém sistematizados na época.

Os estilos modernos da capoeira surgiram no século XX e podem ser divididos em cinco grandes categorias: “capoeira esportiva”, destinada a competições; “capoeira regional”, com forte característica marcial; “capoeira angola”, que valoriza os elementos tradicionais; “capoeira contemporânea”, com uma abordagem mais moderna; e “capoeira gospel”, que tem como objetivo a evangelização. As características de cada um deles serão explicadas em “Estilos modernos da capoeira”.

Em 1953, o fundador da Capoeira Regional, Mestre Bimba, realizou uma apresentação diante do presidente Getúlio Vargas, o primeiro líder populista do Brasil que incentivou o nacionalismo, sendo considerado um acontecimento em que a capoeira foi reconhecida oficialmente pelo governo brasileiro. A aceitação do público melhorou não apenas em relação à capoeira, mas também à cultura afro-brasileira de modo geral, priorizando a natureza performática da capoeira em shows folclóricos que misturavam apresentações de samba de roda e maculelê, etc.

Posteriormente, a capoeira apareceu em muitas obras, como no longa-metragem “O Pagador de Promessas” (Anselmo Duarte, 1962), primeiro filme brasileiro a ganhar a Palma de Ouro no 15º Festival de Cinema de Cannes em 1962, na imortal canção de bossa nova “Berimbau” (Vinicius de Moraes e Baden Powell, 1963) e na minissérie  adaptada do romance "Capitães de Areia" (1937) de Jorge Amado, um dos principais escritores da literatura brasileira do século XX, exibida na televisão em 1989, que contribuíram para a disseminação da capoeira como cultura popular.

Em 1966, a delegação brasileira participou do primeiro Festival Mundial de Arte Negra, realizado na capital do Senegal, Dakar, sendo liderada por Mestre Pastinha, grande autoridade da Capoeira Angola. Isso é considerado um marco histórico para a capoeira, pois foi a primeira apresentação oficial da capoeira no exterior, tendo sido realizada no continente africano, terra onde possui suas raízes.

A verdadeira expansão internacional da capoeira ocorreu na década de 1970, quando mestres e professores começaram a emigrar para a Europa e América do Norte. Além disso, na década de 1990, pode-se dizer que o filme de Hollywood "Esporte Sangrento" (Sheldon Lettich, 1993), que tem a capoeira como tema principal, e o game "Tekken 3" (Bandai Namco, 1998), no qual o estilo de luta do personagem "Eddy Gordo" é a capoeira, provocaram um boom da capoeira ao redor do mundo.

Segundo o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), a capoeira está sendo praticada em mais de 150 países ao redor do mundo. No Japão, há grupos em atividade desde a década de 1990, e hoje temos grupos de diferentes estilos de norte a sul do país, desde Hokkaido até Okinawa, inclusive com o reconhecimento de mestres japoneses. Além disso, Toshio Sako, o extraordinariamente talentoso autor da série superpopular “Usogui” (“Comedor de Mentiras”, em tradução literal. Shueisha, 2006 - 2018), que já vendeu mais de dez milhão de cópias, criou a obra “Batuque” (Shueisha, 2018 - 2024), mangá que narra o encontro da  protagonista Ichiri Sanjo com "a 'capoeira', uma dança de combate que incorpora música, luta, dança, filosofia e religião... ou seja, tudo aquilo gerido pela humanidade" (conforme a sinopse oficial), sendo uma obra-prima cuja trama fala sobre libertação e confluências.

Apesar da preocupação de que a "salvaguarda" da capoeira seria uma expropriação cultural por parte do governo brasileiro, podendo levar à perda da sua autenticidade, a capoeira foi reconhecida, ironicamente, pelo próprio governo como uma cultura afro-brasileira que resistiu a sua opressão, registrando o "Ofício dos Mestres de Capoeira" e a "Roda de Capoeira" como patrimônio cultural imaterial nas categorias Saberes e Formas de Expressão, respectivamente, em 2008.

Ainda, por ser considerada uma atividade cultural afro-brasileira multifacetada que engloba artes marciais, dança, tradição e esporte, além de promover o espírito de resistência, camaradagem, diversidade e afirmação da identidade, a "Roda de Capoeira" (Capoeira Circle) também foi inscrita na Lista Representativa do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade da UNESCO em 2014.

Dessa forma, sem sucumbir mesmo após séculos de perseguição, a capoeira foi transmitida por gerações, dando a volta ao mundo como uma expressão cultural que transcende fronteiras, nacionalidades, crenças, idade ou orientação sexual.